27.10.07

VOLTA AO MUNDO - IMAGENS DE 80 DIAS


EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA DE JOSÉ MARIA PIMENTEL
7 DE DEZEMBRO A 15 DE JANEIRO

"Como sabem, tenho viajado muito. Este facto permite-me corroborar a afirmação de que uma viajem é sempre mais ou menos ilusória, de que não existe nada de novo sob o sol, de que tudo é a mesma coisa, etc, etc., mas, também, bastante paradoxalmente, afirmar que não há fundamento para que se desespere de encontrar surpresas e qualquer coisa nova: na verdade, o mundo é inesgotável."
Jorge Luís Borges, Contos extraordinários.

Há tipos com “sorte”!

Ao relembrar hoje, mais de um ano decorrido sobre a “Viajem de uma Vida”, ocorre-me esta frase, tantas vezes escutada antes da partida, como depois do regresso.
Não sei exactamente o que é a “sorte”. Acredito que de certa forma existe, que a uns surge mais frequentemente do que a outros, que alguns quase nunca a viram. Também penso que temos que a empurrar um pouco e saber reconhecê-la quando aparece no horizonte. Tenho certamente alguma e, o tal horizonte, trouxe-a através de um telefonema no Natal de 1999: - Se eu não queria ir como navegador do automóvel português inscrito para o “Around the World in 80 Days”, um rali para clássicos, recriando a aventura da obra de Júlio Verne?

Dou uma primeira nega. Quase três meses de ausência fora das obrigações da família e do dia a dia, parecem-me impossíveis e egoístas para com quem fica. Tento esquecer, haverá outros sonhos possíveis. As semanas passam. Novo telefonema, tenho de me decidir, sim ou não!?
E, porque da minha “sorte” faz sobretudo parte uma família extraordinária e uns quantos amigos com “A” grande, aconteceu o empurrão, o “tens que ir”, “isto é uma aventura para ti”!
Depois, foi a obsessão de todos os dias, a preocupação de não falhar, de aprender o que não sabia destas andanças. À minha volta, “os invejosos bons” davam conselhos, preocupavam-se, procuravam ajudar.
De repente era 1 de Maio de 2000 e estávamos em Londres, na Tower Bridge fechada ao trânsito.
Sir Stirling Moss, o velho campeão de Fórmula 1, dava a partida àquele incrível conjunto de velharias habitadas por uns quantos “originais”, dispostos a atravessar o mundo e a tudo fazer para brindar a chegada a 18 de Julho.
Adrenalina 100%. O adeus…

Bagagem pessoal pouca, mapas e road-books muitos, sobressalentes, dois tanques para gasolina e os meus mais preciosos companheiros de aventura: una quantos quilos de filmes e material fotográfico. Na cabeça, o projecto de um livro.
Um rali é, de certa forma, também uma rotina. 500 km em média por dia, orientação por mapas e road-book sempre nos joelhos, controles de tempos, mecânica de fim de dia, (quando não durante), cansaço…
Os primeiros dias mostraram-me que corríamos o mundo demasiado depressa. Sentia a frustração de ainda não ter “visto” e já lá ir…mas, estávamos numa corrida e não queríamos falhar a chegada, não havia tempo para sonhar.
Usei a máquina fotográfica como um bloco de notas de imagens dispersas, instintivamente, sem reflectir, porque seria tarde demais. Elas dar-me-iam mais tarde o tempo para lembrar e sonhar que, não houve. Talvez um dia também, ao olhá-las, pudesse decidir voltar e “VER” algum desse mundo…
José Maria Pimentel